Fazia frio no Campo Limpo. O céu vestia branco e havia mais tristeza que de costume. Eu não emprestara nenhum livro naquele dia, as faces esperando os ônibus iam nubladas, as crianças passavam dormindo e as árvores estavam nuas mas onde estavam suas folhas secas?
Já me levantava pra ir embora quando vi a senhora Irene fechando o portão de casa, ela veio caminhando toda encolhida, num passo lento, bem lento e apoiou as duas mãos na cesta de livros, pousava o olhar nas capas sem ler, respirava fundo e suspirava, seus olhinhos brilhavam tristonhos, quase escondidos na pele enrugada. Botou a mão em meu ombro e me sussurrou no ouvido – Meu marido morreu – desatou em lágrimas…
Fiquei paralisado, minha alma fez silêncio, abracei-a, seu corpo era frágil e tremia, meu corpo era forte e também tremia, chorei, ela acariciava sem jeito minha nuca gelada.
Fora casada por cinquenta anos, ao que poderia se apegar agora, perdera o companheiro de uma vida toda. Mas viera buscar um livro… Lhe ofereci um pequeno de contos ao que ela respondeu – Quero outro, maior, preciso viajar por um tempo – Mostrei o Balzac de quinhentas páginas, ela avaliou o volume, sorriu bem de leve e voltou pra casa no mesmo passo lento, bem lento. Eu garoava, me sentei novamente, havia compreendido tudo.
http://versosevasos.blogspot.com/
Marcus Vinícius - Mascote
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2 comentários:
Acho que um livro já mudou muitas vidas, né?
Lindo, lindo, lindo...
viva o poeta vivo. como um quadro que apasigua, chora e contiua...
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